Sexta-feira
Zé Tadinho
Desceu o morro
Para jogar baralho
Segunda-feira
Não foi trabalhar
Estava jogando maralho…
A molecada gritava :
– Zé Tadinho tá na mão dos homens.
Ele irá confessar ?
– O que porra, eu não sei do que vocês tão falando!…
– Sabe sim, confessa!!!
– O quê ?…
Bamm, plaft, toc, pimba…
– Ai, ai, ai! Confessar o quê, porra…?
– Respeite a autoridade, seu malcriado!
Toma, toma, toma, toma, toma, toma, toma, toma e toma…
Racharam a cabeça dele ao meio, uma banda caiu para o lado sul e outra para o lado norte.
Arrancaram uma perna na altura da rótula-joelhar, electrocutaram o seu pau com ovo e tudo, deram o braço esquerdo para o cachorro policial e o antibraço para o delegado perguntador.
Tiraram os miolos da cabeça rachada e jogaram na mesa do juiz de plantão.
Puxaram os olhos dele com os dedos indicadores e o gato da delegacia comeu como se fossem ostras frescas.
Que delicia ser animal de estimação de quartel .
Zé Tadinho sentado num tamborete descançava uma perna que restava.
– E agora vai confessar?
Zé Tadinho esparramado por todos os lados do país.
Pensava em se revoltar.
Um pedaço da bôca dele que estava grudada na parede mandou os perguntadores, com uma voz meia fanhosa :
– Vão se arrombar cambadas de fardados…
Pimba, pimba, bam, bam!
– Respeite a autoridade bôca filha da puta!
O pedaço da bôca levou uma cacêtada.
Se espatifou em pequeninos pedacinhos
De ossinhos e dentinhos quebradinhos.
– Vai confessar agora, vagabundo?
Um dos braços de Zé Tadinho que estava pendurado na bôca do cachorro policial deu um sôco na cara dos homens.
– Respeite a autoridade, pedaço de braço agressivo.
Pam, pimba, pimba, pum, pum.
E o pedaço de braço foi massacrado ou melhor…
Metralhado.
– Vai confessar agora, vagabundo?
Era um cénario tipico de investigação.
Os direitos dos homens misturados com tripas, estômago, intestino grosso, intestino fino, fígado, ríns, coração, bófe, orelha, lingua, miolos, olhos, dedos dos pés, dedos das mãos, coxas, palavras, pensamentos e tudo que se pode desconjuntar de um torturado…
Mais em todo cénario típico, há sempre um homen bom e esse homem bom varreu com uma vassora nova aqueles restos de liberdades trituradas.
O cachorro e o gato da delegacia brigaram a noite toda por causa de uma tripinha que havia escapada da vassora do homem-bom.
Zé Tadinho jurou :
– Se Deus quiser,
Continuarei fantasiado
De quarta-feira de cinzas…
© Ethel MUNIZ